Jorge Pinheiro Machado aponta quais projetos podem representar uma fértil semente para o equilíbrio sócio-econômico-ambiental.
Existem duas pequenas histórias que aparentemente são conflitantes. A primeira é uma rápida citação atribuída ao filósofo francês do século 18 Voltaire, que dizia: “Em uma avalanche, nenhum floco de neve se sente o responsável”. A segunda é uma metáfora popular que fala sobre a luta de um pequeno passarinho que tentava apagar o fogo na floresta voando entre o riacho, molhando suas asas e se sacudindo sobre o fogaréu: “Passarinho, o que está fazendo? Venha se unir a nós...”, disse um dos tantos animais da floresta. “Estamos aqui discutindo como será possível acabar com todo este fogo que assola a nossa floresta, você por acaso pensa que sozinho poderá acabar com este fogo?”, questionaram. Ao que o passarinho respondeu: “Se cada um de nós fizer a sua parte e vier me ajudar...”. É neste universo de consciência social, trabalho colaborativo e estratégia, que Jorge Pinheiro Machado, especialista em projetos que visam o desenvolvimento sócio-econômico-ambiental e conselheiro editorial da Revista Vidi, recebeu nossa reportagem para responder questões cruciais para o atual momento do Brasil e do mundo no que tange a sobrevivência de nosso planeta.
VIDI – Falando em soluções, qual o futuro do crescimento sustentável?
Jorge Pinheiro Machado – O futuro só existirá se tivermos um crescimento econômico e financeiro realmente sustentável, que respeite o equilíbrio sócio-econômico-ambiental. Isso depende basicamente da melhora nos níveis de educação, para que assim cada ser humano se transforme em um cidadão consciente. Acredito firmemente que a união da ciência e da tecnologia aliada ao saber tradicional será a ferramenta adequada para a sociedade do século 21 encontrar o seu ponto de equilíbrio.
JPM – Estamos em um mundo capitalista e tentativas de implantação de um sistema diferente sempre terminaram em frustração e em um alto custo para a sociedade. O elo econômico oferece a auto-sustentabilidade a cada ação do ser humano. Trata-se de um argumento fatal para a conquista de mais adeptos do equilíbrio sócio-econômico-
ambiental. Vou dar um exemplo, sempre que tenho uma ideia nova, eu acho que ela deve ser testada em Minas Gerais. O mineiro é por natureza conservador e desconfiado de tudo. Há tempos consegui convencer um amigo incorporador e construtor imobiliário de Belo Horizonte a aplicar as regras da construção verde em seus projetos.
Pois bem, ele escolheu um bairro de classe média e construiu um prédio residencial seguindo todos os passos da construção verde, somente não certificou, pois segundo ele ficava muito caro. Mas o resumo da opera foi que o custo ficou apenas 10% mais caro, porém ele vendeu as residências com um ágil de 30% do preço médio do mercado.
A classe média, devido a sua escolarização, está mais antenada as causas socioambientais, mas para eles, a razão econômica é importante também. Comprando uma residência em um edifício que recebeu os conceitos da construção verde, com certeza os custos mensais do condomínio serão menores, já que o empreendimento passa a oferecer eficiência energética e reuso de água, por exemplo.
Com o advento da tecnologia, ao longo do tempo, certamente a diferença de custos entre uma construção verde e uma convencional não existirá mais e, como a construção verde deverá ser uma exigência do consumidor do século 21, o diferencial do preço de venda também não existirá, pois será uma commodity no mercado imobiliário.
JPM – Eles se relacionam através da educação. E a educação é um processo que leva décadas. Entretanto, em épocas de transição sempre é preciso um incentivo para que não se perca muito tempo para atingir os resultados que a ciência diz ser necessária e premente. Trata-se do que muito se discute hoje como o denominado imposto verde. Muitos acham que taxando tudo aquilo que for insustentável premiará o sustentável. Teoricamente podem até estar certos, mas em uma sociedade entulhada de impostos, criar mais um pode ser a gota d’água para uma revolta. Vide os coletes amarelos (grupo de manifestantes franceses) que se originaram basicamente contra esse tipo de taxação. Sou favorável a alíquotas para o sustentável e deixar a taxação corrente para os insustentáveis até que os sustentáveis não precisem mais desse incentivo.
JPM – Certamente, o primeiro deles é o modelo que o R20 – Regions of Climate Action, Fundação criada pelo ex-Governador Arnold Schwarzenegger, que ajuda as cidades brasileiras a implementarem e investirem em iluminação pública com a tecnologia Led, opção que proporciona uma economia de energia elétrica de até 70%, o que beneficia muitos os cofres públicos, e ao mesmo tempo, proporciona uma sensação de segurança ao cidadão devido sua amplitude de iluminação maior.
Outro projeto que me orgulho bastante é o de ter ajudado a criar o grupo Soluções da Amazônia, um apanhado de projetos que foram implantados com sucesso pelos amazônidas e que com uma escala maior vai ajudar a melhorar a qualidade de vida da população local, transformando cada membro das comunidades locais em guardiões da floresta. Também não posso esquecer do projeto que participo no momento que é a criação da E-cloud, uma empresa que visa oferecer soluções integradas de eficiência energética, geração distribuída, armazenagem e software de gestão elétrica para os grandes consumidores de eletricidade no Brasil.
JPM – A primeira personalidade que tive contato foi o Presidente Clinton, quando me tornei membro do Clinton Global Initiative. Um projeto focado em propagar e dar escala as soluções em diversas áreas. Já com o Príncipe Charles, que foi um propulsor da criação do Soluções da Amazônia, além de admirá-lo por ser um precursor da sustentabilidade, aprendi com ele a dar valor ao saber tradicional. Após ter participado de um board meeting da Green Cross em Nova Orleans, nos EUA, também passei a
admirar a coragem e astúcia do estadista russo Mikhail Gorbachev, que procurava fazer a coisa certa, mesmo em momentos difíceis. Com Schwarzenegger passei a valorizar muito o pragmatismo e o foco em arregaçar as mangas e estabelecer e cumprir as metas de ações concretas que se mostrem como exemplos a serem replicados.
Agora, minha relação com a Fundação Leonardo DiCaprio é recente, mas me inspira muito, pois hoje ela tem como CEO, o Terry Tamminen, que foi Secretário de Meio Ambiente do Governo Schwarzenegger e, diga-se de passagem, um democrata como Secretário de um Governador Republicano. O Terry tem me inspirado muito ao longo desses anos de trabalho.
JPM – Sem dúvida alguma é o Programa Município VerdeAzul (PMVA), projeto implementado no Estado de São Paulo há 10 anos. Com mais de 5 mil ações implantadas nos municípios participantes, creio que com o impulso que o Governador João Doria dará a esse projeto, veremos mais e mais municípios captarem investimentos e gerarem empregos por meio da economia verde. Hoje, no mundo existe mais de US$ 5 trilhões comprometidos com o desinvestimento da economia fóssil e que visam migrar para a economia verde. Faltam projetos sustentáveis e segurança jurídica para servirem de porto seguro para esse capital.
Comments